Transtornos alimentares e sofrimento psíquico na contemporaneidade

Ana Clara Alves de Araújo, Fernanda Guerra Roman Náufel do Amaral, Juliano Moreira Lagoas

Resumo


Em um contexto cultural marcado por rigorosos ideais estético-corporais, não é de se
estranhar o crescimento significativo dos quadros de Transtornos Alimentares na clínica de
um modo geral, especialmente entre mulheres jovens. Partimos, neste trabalho, da
consideração de que sintomas não são fenômenos naturais, inteiramente determináveis no
plano da objetividade empírica, mas respostas do sujeito às exigências psicossociais que
sobre ele recaem, estas, por sua vez, organizando-se em função de determinadas condições
históricas, culturais e, sobretudo, políticas. Concebendo o sintoma como uma mensagem
endereçada ao Outro, a pesquisa buscou identificar algumas das modalidades de satisfação e
de relação com o campo da fala e da linguagem implicadas na constituição dos sintomas
anoréxicos. Para isso, adotamos os princípios metodológicos da Análise de Discurso de
matriz francesa, articulados aos aportes teórico-clínicos da psicanálise. O material de análise
foi construído por meio de entrevistas semi-estruturadas com uma paciente diagnosticada
com Anorexia e recém-saída de um período de internação em clínica de tratamento
psiquiátrico. As entrevistas foram gravadas, e posteriormente transcritas. Hipotetizamos,
com base na literatura lacaniana, que a recusa do alimento reenvia o sujeito anoréxico a
uma Outra cena, fantasística, na qual se evidencia aquilo de que se trata: da fome de amor.
As análises foram planejadas por meio de dois eixos centrais: (i) a função do significante
"anoréxica" na estruturação das dinâmicas psíquicas e afetivas da entrevistada; e (ii) o
estatuto das relações entre Real, Simbólico e Imaginário na constituição do sintoma
anoréxico. Em relação ao primeiro eixo, pudemos verificar que o significante "anoréxica" -
vindo, como qualquer significante, do campo do Outro - desempenha uma verdadeira
função subjetivante, na medida em que sua fixação demarca, no conjunto dos significantes
que constituem a história do anoréxico, o lugar vazio no qual o sujeito (o do inconsciente,
que é o único a nos interessar) se instalará. Já quanto ao segundo eixo, vimos que o sintoma
anoréxico, ao contrário de mera manifestação fenomenológica de certas disposições ou
conflitos psíquicos, deve ser localizado e pensado nas intersecções entre os registros da
linguagem (Simbólico), da imagem corporal (Imaginário) e do corpo pulsional (Real). Nesse
sentido, nossa hipótese de trabalho, explorada sob o ângulo desses dois eixos de análise,
revelou-se um caminho interessante para pensarmos o gesto da recusa em suas dimensões
Simbólica (pois que dirigida ao próximo), Imaginária (já que implica a rivalidade com o
semelhante) e Real (na medida em que deixa o corpo um resto não simbolizável).


Palavras-chave


Anorexia; Psicanálise; Sintoma.

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DOI: https://doi.org/10.5102/pic.n0.2019.7519

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