NARRATIVAS INDÍGENAS EM TRÊS CONTEXTOS HISTÓRICOS: TERMOS DE INQUIRIÇÃO (1968), DISCURSOS NA CONSTITUINTE (1987) E DEPOIMENTOS NA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE (2014)
Resumo
Em pesquisa realizada anteriormente com apoio de bolsa de iniciação científica (UniCEUB/ CNPQ, 2014/2015), nos dedicamos à análise descritiva de um documento produzido na década de 1960 e que ficou conhecido no campo indigenista como Relatório Figueiredo. Nele são denunciadas diversas irregularidades cometidas pelo extinto Serviço de Proteção aos Índios – SPI (1910-1967). O documento tem mais de 7 mil páginas e está dividido em 30 volumes que foram digitalizados e disponibilizados publicamente em ambiente virtual. Na pesquisa aqui apresentada nos propusemos a analisar mais detidamente parte específica desse conjunto documental: vinte e um (21) Termos de Inquirição assinados por indígenas que denunciam as situações de violência às quais foram submetidos desde décadas anteriores. A fim de problematizar o alcance das vozes indígenas e as tentativas consecutivas de silenciamento desses sujeitos, decidimos inserir na nova análise outros dois conjuntos documentais que trazem narrativas indígenas em contextos diferentes e posteriores aos termos de inquirição: depoimentos de indígenas na Constituinte de 1987 (debate que originaria o texto da Constituição de 1988) e narrativas que fazem parte do conjunto de documentos analisados pela Comissão Nacional da Verdade e publicados em 2014. A interlocução teórica com a bibliografia sobre indigenismo e história indígena nos fez perceber como as narrativas produzidas pelos próprios sujeitos indígenas estão sub-representadas mesmo naqueles contextos históricos em que, politicamente, a cidadania indígena é pauta central dos eventos históricos, seja a Comissão de Inquérito de 1967/68, a Constituinte de 1988 ou o Relatório da Comissão Nacional da Verdade em 2014. Interessou-nos perceber como os indígenas articularam, em diferentes momentos históricos, resilientes formas de cidadania insurgente. Buscamos compreender como os indígenas são estigmatizados e silenciados por uma compreensão de cidadania que não os reconhece efetivamente pelo princípio da diferença e sim por uma representação que os subalterniza, o que exige que esses sujeitos reinventem permanentemente formas de resistência. Desse modo, nos contextos históricos em que se pauta a cidadania indígena, esses sujeitos coletivos, apesar do aparente posicionamento como tema central, tiveram suas próprias falas distribuídas perifericamente em relação aos processos analisados. Tomamos o conceito de “cidadania insurgente”, desenvolvido pelo antropólogo estadunidense James Holston, explorando-o de forma a compreender formas de resistência indígena às imposições de uma cidadania que historicamente converteu esses sujeitos em signos sem significado, ao sub-representar suas próprias narrativas, conforme percebemos na documentação analisada. Tal análise demonstra a complexidade e a atualidade de um debate que considere os limites e as interdições impostas desde o século XIX à cidadania indígena no Brasil
Palavras-chave
Texto completo:
PDFDOI: https://doi.org/10.5102/pic.n2.2016.5571
Apontamentos
- Não há apontamentos.